A única hipótese de sobrevivência para a espécie humana é a colonização espacial nos próximos 100 anos, diz o astrofísico. Mas não há aqui alguma falta de optimismo?
Um dos mais importantes e populares cientistas da nossa era, Stephen Hawking, 68 anos, é o autor de Uma Breve História do Tempo e de The Grand Design (editado no Reino Unido em Setembro). Quando disse, em entrevista ao site Big Think, divulgada segunda-feira pela AFP, que "vê grandes perigos" no futuro e estabeleceu paralelos com a crise dos mísseis de Cuba (1962) e respectiva Guerra Fria e temor nuclear, mostrou o seu descrédito na possibilidade de o homem evitar esgotar os recursos naturais do planeta e de lidar com a sobrepopulação, sem esquecer a iminência de uma guerra destruidora. "Estamos a entrar num período cada vez mais perigoso da nossa história", alertou. "A nossa população e o nosso uso dos recursos finitos do planeta Terra estão a crescer exponencialmente, em simultâneo com a nossa capacidade técnica para mudar o ambiente para o bem ou para o mal. Temos feito progressos notáveis nos últimos 100 anos. Mas se queremos continuar nos próximos 100, o nosso futuro está no espaço."
Optimista, diz ele
O físico, num dos seus mais negros avisos de sempre, disse ainda neste site que se foca na busca e debate de novas ideias, que houve uma série de momentos no passado em que a sobrevivência foi uma questão de sorte, dependeu de decisões momentâneas. "A crise dos mísseis de Cuba foi um deles. É provável que a frequência de tais ocasiões aumente no futuro", acrescenta. "Será só por si difícil evitar o desastre nos próximos 100 anos, quanto mais nos próximos milhares ou milhões [de anos]." Mas, acredite-se ou não, Hawking diz-seum optimista: "Se conseguirmos evitar a catástrofe nos próximos dois séculos, a nossa espécie deve permanecer segura à medida que nos espalharmos pelo espaço. A raça humana não deveria ter todos os seus ovos no mesmo cesto, ou num único planeta."
Para o coordenador do Programa Gulbenkian Ambiente, Viriato Soromenho Marques, "optimismo" não é a palavra em que pensa quando reflecte sobre a ideia de Stephen Hawking. "É uma fuga para a frente, uma ideia que revela falta de sabedoria num homem muito inteligente, mas sem senso comum", diz ao P2 por telefone. Para o professor da Faculdade de Letras da Universidade Nova de Lisboa, há que encarar os actuais problemas ambientais como consequência de "um modelo de civilização que foi definido há 200 anos e que nos tornou dependentes de combustíveis fósseis, do carbono", e pensar agora "numa solução que terá de ser tecnológica, mas sobretudo política, ética, jurídica - encarar um novo modus vivendi".
Menos duro é o astrónomo Pedro Russo, coordenador do Ano Internacional da Astronomia em 2009 e afiliado da União Astronómica Internacional, que diz ao P2 compreender as declarações de Hawking. Russo acredita que a comunidade científica está de acordo num ponto: "É preciso exploração espacial para responder às diferentes questões que o Universo ainda esconde." Mas, em termos práticos, a ideia de Hawking é exequível num momento em que a Agência Espacial Norte-Americana (NASA) está a conter orçamentos, em que os voos tripulados são alvo desses cortes e em que "tempo" é uma variável essencial?
Pedro Russo recorda que, apesar de a NASA e de a Agência Espacial Europeia (ESA) estarem em sintonia quanto às dificuldades de enviar missões tripuladas a Marte nas próximas duas décadas, como agendou em 2004 o então Presidente dos EUA George W. Bush, as declarações de Barack Obama são animadoras. O actual Presidente americano afirmou recentemente que, em meados de 2030, vamos estar preparados para enviar humanos para Marte. "Acredito que estamos próximos de ter a tecnologia certa para enviar estas missões, mas só a vontade política pode concretizar estes planos", diz o cientista. 2030, portanto, e um punhado de humanos.
A única alternativa
Falamos de Marte porque é a única alternativa, garante Soromenho Marques. "Vénus é o nosso futuro, é um planeta efeito estufa" e "não há tecnologia" para pensar de forma realista na colonização espacial em cerca de 100 anos. "Só [há tecnologia] para chegar a 2050 com uma economia que dependa muito menos (cerca de 35 por cento e não os 81 por cento actuais) do carbono", frisa.
Em termos de custos, a ideia de Hawking seria multimilionária. Pedro Russo fala apenas do que conhece: "As diferentes estimativas para enviar uma tripulação a Marte estão entre os 20 e os 450 mil milhões de euros." E temos tempo, afinal, para isto? "Para termos uma ideia das escalas de tempos e distâncias envolvidos, para chegar ao mais próximo planeta extra-solar (neste momento foram descobertos mais 470 destes planetas), que está a 10,5 milhões de anos-luz, seriam necessários 185 mil anos, a uma velocidade de 61.452 km/h, a velocidade da sonda espacial Voyager."
Um dos argumentos de Hawking é a defesa dos voos espaciais tripulados, o que faz Pedro Russo sublinhar que o astrofísico fala meras semanas depois de o presidente da Royal Society of Astronomy ter afirmado que os humanos não são necessários para a exploração espacial, confiante na tecnologia, e num momento em que o Reino Unido está a reestruturar a organização e financiamento das ciências espaciais. "O que cria algum nervosismo na comunidade. Acredito que estas declarações são o reflexo desse nervosismo", remata o astrónomo português.
Para Viriato Soromenho Marques, a ideia de colonizar o espaço nos próximos 100 anos é, "do ponto de vista científico, um projecto fantasista e, do ponto de vista político, irrealizável - seria um processo hiperelitista, uma Arca de Noé".
Fonte: Público
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